A REAJA – Rede de Articulação e Justiça dos Atingidos do Projeto Minas-Rio, organizações e cidadãos solidários, em respeito à população interessada nos fatos, desdobramentos e informações acerca das atividades e impactos do projeto da Anglo American, vêm esclarecer alguns fatos sobre o recente cancelamento de audiência pública.
Agendada para as 18 horas deste 11 de abril de 2017, em Conceição do Mato Dentro, para apresentação do projeto de expansão da Mina do Sapo do projeto Minas-Rio, o chamado “Step 3”, a audiência pública foi suspensa por liminar concedida em ação popular movida contra o Estado de Minas Gerais, os municípios de Alvorada de Minas, Conceição do Mato Dentro e a mineradora Anglo American. A Justiça acatou as razões apresentadas, relacionadas a falhas na convocação e na disponibilização dos estudos dos impactos ambientais, que, como é recorrente nas ações da mineradora, têm impossibilitado a adequada informação e a participação devida da população e das comunidades atingidas, que já sofrem com a operação do empreendimento.
Assim, prevaleceu a justiça desta vez.
As irregularidades apontadas pela decisão da Juíza do Serro Dra Caroline Rodrigues de Queiroz também foram verificadas pelo Ministério Público Federal (MPF). O MPF recomendou ao Estado (pela recomendação nº 17/2017) o adiamento da audiência pública até a viabilização do amplo acesso (inclusive na internet) ao teor dos documentos e a garantia da participação dos atingidos e moradores da área de entorno, devidamente informados, no processo decisório acerca do empreendimento. A medida foi também solicitada no ofício nº 138/2017 da Prefeitura Municipal de Conceição do Mato Dentro, cujo teor desmente falsidades veiculadas pela Anglo American na nota desinformativa, postada na página da mineradora na noite do último 11 de abril.
De acordo com a manifestação da Prefeitura, a Anglo American e o próprio Estado, por meio da Superintendência de Regularização Ambiental (Supram), só protocolaram o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) nos dias 20 de março e 4 de abril de 2017, respectivamente, desacompanhados de documentos “imprescindíveis para a análise do processo de licenciamento”. A prefeitura registrou em seu ofício que o prazo para exame prévio dos estudos e dos potenciais impactos relacionados era, assim, impraticável; e que numa “análise rasa e preliminar” o projeto “apresenta expressivas alterações” ao inicialmente licenciado!
Os cidadãos e entidades abaixo assinados, que testemunham ou assessoram, desde 2007, os reiterados pedidos por justiça e controle da legalidade nos processos de licenciamento do projeto Minas-Rio, vêm, a público, manifestar irrestrito apoio aos proponentes e endossar os termos da ação popular referida.
Mensagens compartilhadas nas redes sociais de Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas na noite do dia 11/04/2017, divulgam os nomes dos autores da ação da popular e, reproduzindo a íntegra do comunicado oficial da mineradora, omitem a informação a respeito da recomendação legal do MPF e sobre o requerimento da Prefeitura de Conceição pelo o adiamento da audiência.
Por sua vez, a afirmação veiculada na Nota da Anglo de que o cancelamento “traz prejuízos ao processo de licenciamento” e “coloca em risco a continuidade operacional do Minas-Rio”, configura grave estratégia de pressão sobre cidadãos que, de forma legítima e com base em direitos constitucionais, demandaram a atuação da Justiça, frente a irregularidades e violações dos direitos das comunidades atingidas.
Muitos são testemunhas de que a balança da Justiça pendeu muitas vezes para a MMX e a Anglo American, e liminares foram caçadas poucas horas após decisões judiciais serem emitidas em favor da transparência do processo de licenciamento. Não há como aceitar que a Anglo American pretenda atingir e coloque o ônus do cancelamento da audiência sobre os que, por meio de um instrumento constitucional, cidadão e democrático, como a ação popular (que visa salvaguardar a observação das leis e dos direitos), buscaram essencialmente o objetivo de garantir que a audiência pública não viesse a constituir novo atropelo ao direito à participação livre e bem informada dos habitantes dessa região. Por isso, coube a construção da ação popular, resultado de uma articulação em rede, visto que o governo estadual não garante o cumprimento desse papel há quase uma década.
O ocorrido no dia 11, lastimavelmente, comprova o diagnóstico sobre a postura do Estado. Apesar da decisão judicial ter sido apresentada aos representantes da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável responsáveis pela condução da audiência pública – inclusive pelo promotor da Comarca e os autores da ação popular – aqueles relutaram (por uma hora e meia) em acatá-la. Protelaram o reconhecimento da existência da decisão judicial, desta forma concorrendo, com a negligência habitual do Estado, para acirrar os ânimos e gerar falsas expectativas nos que compareceram ao ginásio.
É importante destacar que a Anglo American fez a solicitação da audiência no dia 13 de março, através do oficio AA.MFB: 052/2017, no qual informa, como um dos fundamentos, afastar a possibilidade de “riscos associados ao cronograma de julho de 2017, quando a empresa pleiteia a obtenção da Licença”. A mineradora solicitou que a audiência fosse realizada entre os dias 11 e 18 de abril e seu pedido foi atendido pelo Governo do Estado, na mesma data, conforme o Memorando nº 16/2017, assinado pelo secretário adjunto de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Estado, Sr. Germano Luiz Gomes Vieira.
Na nota que circula desde a noite de terça-feira (11/04/2017), a Anglo American afirma que o cancelamento desta audiência “cerceia a participação e a transparência cultivada junto à população” e que tem “consciência de que o diálogo aberto e respeitoso é caminho para construirmos juntos um legado positivo para a região” (grifos nossos). No entanto, o que está claro para muitos, nos últimos anos, é que a Anglo American (na mesma trilha da MMX e outras grandes mineradoras) nunca dialogou e sempre atuou de forma impositiva, contando com a omissão e conivência de autoridades públicas, assim como jogou e continua a insistir na estratégia de jogar cidadãos contra cidadãos.
Quando não consegue demover a Justiça, tenta se colocar acima dela. A Anglo American sempre tenta desconhecer ou omitir a realidade dos cidadãos e os argumentos que se contrapõem ao seu processo ambiental e socialmente predatório e, quando a Justiça dá razão aos que a questionam, fomenta ambiente para a sua execração irresponsável, ou seja, a torná-los alvos fáceis de pessoas menos informadas ou ainda iludidas com promessas da empresa.
Assim, o que vem acontecendo, reiteradamente, é o uso, pela Anglo American, de estratégias de pressão covardes –tais como as ameaças de desemprego e de risco de descontinuidade operacional, como se estes nada tivessem a ver com a concepção do projeto e a forma de tentar impô-lo na marra. Além disso, o obscurantismo da empresa em relação a suas reais pretensões é mais uma forma de dificultar a qualidade do debate e uma discussão isenta em torno de sua proposta.
É direito de todos saber e decidir. É direito escolher o destino e o ritmo do desenvolvimento de projetos na região que ocupamos há alguns séculos. Não será uma empresa que acumula passivos de denúncias de violações de direitos que nos amordaçará a voz e nos cerceará os direitos que temos como cidadãos. Esperamos que o governo atual revogue a anuência e não se submeta à Anglo American, como outros em passado recente, e que promova o debate e procedimentos adequados para o bom conhecimento do projeto antes de qualquer decisão a respeito do step 3.
Conceição do Mato Dentro, 13 de abril de 2017.
  1. Rede de Articulação e Justiça dos Atingidos do Projeto Minas-Rio- REAJA
  2. Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade – AFES
  3. Ana Flávia Moreira Santos (Professora Adjunta do Departamento de Antropologia e Arqueologia – UFMG)
  4. Andrea Zhouri (Professora Titular do departamento de Antropologia e Arqueologia da UFMG)
  5. Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular
  6. Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração
  7. Comissão Pastoral da Terra – CPT / Coordenação Nacional
  8. Elcio Pacheco (OAB/MG 117511 – Rede Nacional de Advogados(as) Populares – Renap)
  9. Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional – FASE
  10. Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc)
  11. Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA/UFMG
  12. Grupo de Trabalho em Assuntos Agrários da AGB (Associação dos Geógrafos Brasileiros), seções Rio de Janeiro-Niterói
  13. Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade – PoEMAS
  14. Gustavo T. Gazzinelli (MG.607.204 – Jornalista, Ambientalista, Conselheiro do CERH/MG)
  15. Klemens Laschefski (Professor do Departamento de Geologia da UFMG)
  16. Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela
  17. Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM)
  18. Movimento pelas Serras e Águas de Minas (MovSAM)
  19. Natália Neme Carvalhosa (Doutoranda do Programa de Pós Graduação em Antropologia Social – PPGAS/UFRJ) Políticas Alternativas para o Cone Sul – PACS
  20. Programa Polos de Cidadania/UFMG
  21. Rede “Igrejas e Mineração”
  22. Ruben Siqueira (Sociólogo, da CPT – Comissão Pastoral da Terra)
  23. Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia – Sinfrajupe
  24. SOS Serra da Piedade