Ação foi possivelmente feita por mineradoras da região em área que abrange o maior quilombo do Brasil, o Kalunga 

Mais de mil hectares de área no Complexo do Prata, região que fica localizada na Chapada dos Veadeiros (GO), sofreu um desmatamento criminoso na última semana, em que foi comemorado o Dia Mundial do Meio Ambiente. A ação foi possivelmente movida por interesses de mineradoras instaladas nessa região, sem qualquer autorização ambiental.

Tratores e correntões passaram devastando parte do bioma, que estava completamente preservado até então. O arrendamento foi feito na Fazenda São Domingos, e realizaram o desmatamento na Fazenda Alagoas, de outro proprietário, sem qualquer licença ambiental para a ação. “As investidas das empresas de mineração na região, em vários casos, ocorrem de maneira silenciosa, quando a população toma ciência do assunto já houve processo de instalação, ou quando há algum tipo de agravamento, como danos ambientais e impactos socioculturais”, explica Ana Lêda, da coordenação nacional do MAM, que é moradora da região.

Segundo matéria do G1, as equipes da Secretaria de Meio Ambiente do Goiás e da Polícia apreenderam cerca de 300 toneladas de calcário, utilizado na correção de solo para possibilitar a exploração agrícola. A matéria, inclusive, também aponta envolvimento de mineradoras na compra e venda da fazenda – sem identificar ao certo, qual interesse econômico teve protagonismo no desmatamento.

O território também passa pelo discurso perigoso do desenvolvimento quando o assunto é a exploração de terras, induzindo a população a ver o lado do desenvolvimento econômico na região, ignorando todo o contexto histórico ambiental, cultural e social do território e a importância que ele tem para o ecossistema do país, como é o caso da região quilombola citada, que é considerada patrimônio natural da humanidade.  “Esses debates são feitos por vários movimentos que são do território ou estão inseridos por aqui, como as associações quilombolas, de turismo, movimentos sociais como o MAM, que trabalham a pauta minerária no Brasil e grupos artísticos que fazem o processo de formação e informação através da cultura”, conta Ana.

HISTÓRICO
Se formos fazer uma análise histórica da mineração na região da Chapada dos Veadeiros, nota-se que a mais de 300 anos ocorre a extração mineral nessas localidades, e mesmo assim, o município de Cavalcante com o Índice de Desenvolvimento Humano de 0,584 (2010), que é considerado muito baixo. Mesmo com tantos anos de mineração e com IDH baixo, o discurso de desenvolvimento continua o mesmo.

Nos últimos anos tem aumentado os números de pesquisas e requerimentos na Chapada dos Veadeiros. Em 2018 foram mais de 400 processos, grande parte dessas pesquisas são realizadas dentro do território Kalunga, com mais de 30 deles só no Vão do Moleque. A comunidade desconhece essas pesquisas. De acordo com a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, é necessário que seja feita consulta e informe sobre as ações feitas dentro dos territórios quilombolas.

“Isso mostra a existência de um racismo ambiental, que está arraigado na nossa sociedade brasileira. Além da propagação de discursos que são refutados na prática, essas ações degradam a região, poluem as águas. Na área urbana de Cavalcante tem uma barragem de rejeitos (conhecido como lago) que até hoje não foi feita a recuperação da área. Também há destruição de pontes, por onde passam caminhões carregados de minérios, há o aumento de poeira por onde passam essas frotas, e tudo isso é extremamente insalubre para a população local”, conclui Ana Lêda.