Dossiê aponta que número de homens e mulheres envolvidos em disputas no meio rural paulista é “alarmante”
A região do Vale do Ribeira, a mais empobrecida do estado de São Paulo, está historicamente ligada à mineração e aos conflitos agrários do campo paulista. “Nós não temos energia elétrica, não temos estradas, mas a nossa luta principal é pelo reconhecimento de nossa terras”, afirma Claudemar Henrique Pedroso, morador da Comunidade dos Caboclos do bairro Ribeirão dos Camargos, localizada no município de Iporanga.
A comunidade é originária do primeiro ciclo de ouro ocorrido no Vale, por volta de 1575. Os caboclos e caboclas descendem dos primeiros colonizadores portugueses e dos povos originários que habitavam as margens do Ribeirão Iporanga.
As terras abrigam hoje 29 famílias e estão sobrepostas pelo Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira. Para Pedroso, o governo demarca reservas ambientais por interesses econômicos na região e é falsa a suposta preocupação com o meio ambiente. Um dos indicativos disso é que a comunidade protocolou um pedido de criação de Reserva de Desenvolvimento Sustentável, mas até hoje não obteve retorno.
São questões como essas que serão debatidas neste sábado (13), no Seminário “As Lutas Sociais Hoje e a Questão Agrária em São Paulo”. Maria Titi Rubio, do Movimento pela Soberania Popular na mineração, que também participa do evento, ressalta a importância de documentar as questões do Vale do Ribeira: “historicamente, a questão minerária faz parte das lutas no campo”, comenta.
O grande atrativo da atividade é a divulgação do Dossiê Lutas Sociais no Campo em São Paulo. O documento, que contempla os anos de 2014 e 2015, é fruto de uma parceria entre o Observatório dos Conflitos Rurais em São Paulo, o Centro de Estudos Migratórios (CEM/SP), o Centro de Estudos Rurais da Universidade de Campinas (CERES/UNICAMP), a Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA – Núcleo SP), a Fundação Rosa Luxemburgo, o Serviço Pastoral dos Migrantes e a Coordenadoria Ecumênica de Serviços (CESE).
O objetivo das entidades é trazer à luz a complexidade dos conflitos que envolvem a questão agrária no estado. “O dossiê nasce da ideia de criar uma interface entre a academia e os movimentos sociais”, sintetiza Gabriel Teixeira, membro do Observatório.
Havia uma necessidade de criar um trabalho com uma solidez metodológica que subsidiasse a ação de movimentos populares. O dossiê vem suprir essa demanda. Além disso, o relatório visa nortear iniciativas de pesquisadores da questão agrária e de gestores de políticas públicas.
O documento perpassa os atores envolvidos, os impactos sociais, econômicos e políticos produzidos por tais processos, a especulação por terras, e o agronegócio. Todas essas questões são discutidas da perspectiva dos próprios sujeitos que resistem à exploração no trabalho. Para Teixeira, a conjuntura política favoreceu a publicação do documento. Segundo ele, há neste momento diversos processos que enfatizam cada vez mais o agronegócio, a exploração da agropecuária e o tema hidromineral, “tendências que acirram ainda mais os conflitos que a gente tem mapeado e que estão expressos nessa publicação”, explica.
Existe uma ideia de que São Paulo não tem problemas no campo. O documento visa desmistificar esses preceitos e trazer um panorama das lutas sociais no estado e sustentar a tese de que o número de homens e mulheres envolvidos em conflitos no meio rural paulista é “alarmante”.
Por Mariana Rosalles, Brasil de Fato
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