No último dia 02 de dezembro de 2020 nos alarmamos com a notícia de que uma das barragens da Yamana Gold, em Jacobina (BA), vem chegando ao teto de sua capacidade de suporte de material. O clima de terror foi instaurado entre as famílias próximas ao empreendimento e as organizações sociais atuantes da região se mobilizaram para denunciar o descaso da empresa e a situação de esquecimento vivido pela população do entorno.

O município de Jacobina, entre tantos impactos danosos da exploração mineral, vive as consequências da supressão de grandes coberturas vegetais em áreas de preservação permanente (APP), da poluição do ar, da água e do solo, além da contaminação diária a que estão expostas, principalmente, as famílias do entorno da mina. Há recorrentes denúncias de vazamentos da mineradora, ocasionando a mortandade de peixes, criatórios dos/as moradores e animais domésticos. O desmatamento das margens do Rio Itapicuruzinho potencializou a erosão e o consequente assoreamento, além de provocar alterações do relevo que modificaram a paisagem de suas encostas. Conflitos pela escassez de água nesta região semiárida, além dos riscos de rompimento da maior barragem de rejeito do estado, operada pela empresa e localizada à montante de comunidades e da sede municipal são as situações vivenciadas nessa localidade ao norte da Chapada Diamantina. As serras deJacobina carregam uma farta história sobre a exploração do ouro, o que perpassa pela formação e pelo crescimento desse município, que nasceu com “vocação aurífera” forjada no sangue e no suor do trabalho escravizado.

A Barragem B2 foi construída em 2008 pela multinacional canadense e tem uma previsão de 20 anos de vida útil. Atualmente está com 55% de sua capacidade e passa pela quinta etapa de ALTEAMENTO A JUSANTE da sétima prevista. No seu final atingirá 126m de altura e terá capacidade para mais de 42 (quarenta e dois) milhões de toneladas de rejeitos, apesar que no Relatório de Segurança de Barragens 2019, a empresa informou à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, que coordena o Sistema Nacional de Informação sobre Segurança de Barragens (SNISB), que a barragem tem uma capacidade de 9,146 hm3. A B2 possui elementos contaminantes ao meio ambiente e às pessoas como o arsênio, que tem origem no próprio mineral e cianeto, utilizado no processo de beneficiamento. No ano de 2010, mais de 100 famílias da comunidade de Canavieiras, onde a barragem foi construída, foram forçadas ao deslocamento de seus lares. No entanto, o direito à indenização somente foi garantido após pressão das comunidades organizadas e intervenção do Ministério Público de Jacobina.

Diante do rompimento ocorrido no dia 02 de dezembro, apenas após a ampla denúncia realizada por organizações sociais, a empresa veio a público se pronunciar, negando fatos ocorridos e minimizando os danos. No dia 04 de Dezembro, a Agência Nacional de Mineração (ANM) realizou uma inspeção no local junto ao Ministério Público, que levou a interdição imediata da barragem até que sejam realizadas correções exigidas.

Na Bahia existem mais de 34 barragens para contenção de rejeitos da mineração que deveriam ser inspecionadas por órgãos federais que hoje sofrem com sucateamento estrutural. Esse crime é apenas mais um na conta do modelo mineral brasileiro que, incansavelmente, coloca o lucro acima da preservação das vidas, da garantia de segurança de seus trabalhadores e trabalhadoras, da prevenção no que tange aos impactos socioambientais.  Tal modelo, que desorganiza a produção local, a agricultura familiar, a defesa dos territórios ancestrais e gera uma sobrecarga para o município atua pelo viés da desresponsabilização, do discurso nebuloso e incerto, da falta de respostas e do ocultamento da verdade. A empresa Yamana Gold acumula inquéritos civis com denúncias de irregularidades em suas instalações e persegue aqueles(as) que trazem a público suas falácias e ludibriações.

Nós, organizações da sociedade civil, moradores e moradoras do município, povos das águas, do campo e da floresta, que acompanhamos o modus operandi das mineradoras em nosso país viemos por meio dessa nota manifestar nossa indignação frente ao descaso da Yamana Gold que se esconde atrás do véu do assistencialismo e da coerção.

Diante do exposto exigimos:

a) Constituição de Conselho Popular para maior participação social das comunidades e organizações civis e populares no acompanhamento do licenciamento, fiscalização e monitoramento dos impactos e do cumprimento das exigências expostas pelo Ministério Público.

b) Transparência da empresa e acesso a laudos técnicos que avaliam a segurança das   instalações.

c) Garantia jurídica de reparação socioambiental por parte da empresa em caso de      incidentes criminosos como ocorridos em Mariana e Brumadinho.

d) Cumprimento das alterações propostas a Lei nº 12.334/2010  pela Lei nº 14.066/2020 da    Política Nacional de Segurança de Barragens.

e) Garantia de fortalecimento de alternativas econômicas a partir do ínfimo tributo gerado     ao Município de Jacobina pela Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais.

f) Criação de um fundo emergencial, como uma caução ao risco que ao fim da operação possa ser utilizada para manutenção do passivo ambiental a ser deixado.

Assinam a nota:

– Comissão Pastoral da Terra (CPT)

– Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM)

– Grupo de Pesquisa em Questões Agrárias do IF Baiano/CNPq

– Conselho Indigenista Missionário (CIMI)

– Salve as Serras (SAS)

– Grupo de Pesquida GeografAR/UFBA

– Associação de Advogados/as dos Trabalhadores Rurais (AATR/BA)

– Escola Família Agrícola do Sertão (EFASE)

– Movimento dos Trabalhadores(as) Assentados(as) Acampados(as) e Quilombolas do Estado da BA (CETA)

– Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)

– EEtnografAR/UFRB

-Conselho Pastoral dos Pescadores  (CPP)

– Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada  (IRPAA)

– Instituto Popular Memorial de Canudos  (IPMC)

– Fórum Popular da Natureza (FPN/BA)

– Grupo Ambientalista da Bahia (GAMBA)

– Pastoral da Juventude Rural  (PJR)

– Levante Popular da Juventude

– Frente Mineira das Atingidas e dos Atingidos pela Mineração (FLAMa-MG)

– Associação dos Docentes da Universidade Federal de Ouro Preto (ADUFOP)

– Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto

– Associação de Ação Social e Preservação das Águas, Fauna e Flora da Chapada (ASPAFF)

– Escola Família Agrícola de Jaboticaba-BA

– Fórum Estadual de Educação do Campo

– Instituto de Geografia pela Paz A.C

– Núcleo de Estudos Território e Resistência na Globalização (NUREG/UFF)

– Geografia, trabalho e ontologia do ser social: estudos sobre a essência da relação sociedade-natureza (GTOSS)

– Grupo de Pesquisa A Geografia histórica da espacialização das forças produtivas no Nordeste brasileiro de meados do século XX ao início do século XXI e seus rebatimentos socioespaciais

– Laboratório de Antropologia, Filosofia e Política (Krisis /UNIVASF)

– Laboratório de Geografia Humana da UNIVASF

– Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Produção Social do Espaço (GEPPSE/CNPq-UNIVASF)

– Movimento de Luta pela Terra (MLT)

– Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Estado da Bahia

– Coletivo de Jovens da região CUC

– Grupo de Agroecologia da Umbuzeiro (GAU)

– Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais (SASOP)

– Coordenadoria Ecumênica de Serviços (CESE)

– Movimento de Mulheres Olga Benário

– Unidade Popular pelo Socialismo

– GEOTER/IFBaiano

– Setorial Ecossocialista (APS/BA)

– Cooperativa de Trabalho e Assistência à Agricultura Familiar Sustentável do Piemonte (COFASPI)

– Associação de Assistência Técnica e Assessoria aos Trabalhadores Rurais e Movimentos Populares (CACTUS)