Nós, da Comissão da Água, moradores do Tejuco, atingidos violentamente pelo crime da Vale, denunciamos neste 22 de março de 2021, Dia Mundial da Água, a grave violação do direito humano fundamental de acesso à água, por qual passa a nossa comunidade – dentre tantas outras violações – provocada pela atividade predatória da mineração. Este manifesto, construído com o Fórum dos Atingidos e Atingidas pelo Crime da Vale em Brumadinho, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (RENSER), convoca a população para refletir e lutar contra a gravíssima situação que enfrentamos.

Vivemos tempos difíceis! O mundo sofre a pior pandemia do último século. A Organização Mundial da Saúde (OMS) conclama o mundo a lavar as mãos como forma de prevenção à COVID-19, utilizando-se do bem comum mais valioso da Terra. O acesso à água é um direito humano fundamental, reconhecido pela comunidade internacional e pelo direito brasileiro na Constituição Federal. No entanto, denunciamos que o atual modelo econômico inviabiliza o fornecimento de água em quantidade e qualidade para o povo e coloca em risco a própria vida na terra.

Água é fonte de toda vida na terra! Água é saúde! Água é bem viver!

A comunidade do Tejuco sofre com a contaminação das suas nascentes pela atividade predatória da mineração. Há dois anos denunciamos cotidianamente nosso estado de grave insegurança hídrica com constantes problemas relacionados à quantidade e à potabilidade da água. Nossas fontes naturais, benção divina da mãe terra, utilizada tradicionalmente pelo nosso povo, sempre preservadas, em outros tempos limpas e abundantes. Agora, estão contaminadas e irrisórias.

O crime/tragédia da Vale mudou nossas vidas para sempre!

O Acordo Judicial celebrado entre Governo de Minas e Vale cria mais um alerta: disfarçado de reparação e em nome do “desenvolvimento”, financiará mais destruição e beneficiará mineradoras e empreiteiras, como no caso do rodoanel. Este irá soterrar nascentes e atingirá o Aquífero Cauê, na Serra do Rola Moça, provocará desapropriações forçadas e destruirá patrimônios históricos/naturais por onde passar. O
Rodoanel atende aos interesses das mineradoras da região, incluindo a própria Vale, facilitando o escoamento da produção de minério de ferro.

Ainda denunciamos, que apesar da destruição de vidas e do meio ambiente, as grandes mineradoras seguem com licenciamentos ambientais facilitados pelo governo mineiro. Segundo levantamento da CPT, de janeiro de 2019 até hoje, foram concedidas, apenas para a Vale, 10 licenças para a exploração de mineiro de ferro, incluindo uma autorização para a mineradora explorar a mina da Serrinha, em Piedade do Paraopeba (Brumadinho), ao lado do monumento natural “Mãe D’Água”.

Os problemas relacionados ao acesso à água de qualidade pela população também são realidade do Córrego do Feijão, do Parque da Cachoeira, do Aranha, e de outras comunidades na própria sede do município de Brumadinho e em diversas comunidades atingidas pelo crime da Vale na bacia do Rio Paraopeba. “O desenvolvimento é uma viagem com mais náufragos do que navegantes” nos alertavam as palavras de Eduardo Galeano.

Água não é mercadoria! Minério não se bebe! O Vale não é turvo, não é da morte!

Reflitamos: É a água um bem infinito? A quem pertence? Podemos confiar na qualidade da água que chega à torneira? Como ficará a saúde sem acesso à água potável? É justo poucos lucrarem com a destruição das fontes de água? Como garantir um mundo melhor para as gerações futuras? Como ter futuro sem água?

Gritamos: As Minas são de água! O Vale é verde, é vida! Sonhamos com um mundo melhor! Outra realidade é possível, e necessária!

Brumadinho, 22 de março de 2021