Segundo especialistas, a medida, que completou um mês neste 23 de julho, não resolve o problema inflacionário e não entregará à população combustível a preço justo
Por Ananda Ridart, da página do MAM
A política de diminuição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre itens como gasolina, diesel, energia elétrica, comunicações e transporte, foi sancionada por Bolsonaro no final de junho. No entanto, a experiência que temos com a Lei Kandir já mostrou para a população brasileira que a desoneração da tributação das mineradoras até gera lucros, mas só para as mineradoras e para o agronegócio, não contribuindo, efetivamente, para o desenvolvimento regional dos estados, que não receberam os “bilhões” prometidos em seus orçamentos.
O ICMS é o imposto responsável por grande parte dos tributos arrecadados pelos estados brasileiros, e assim como a Lei Kandir, que isenta as mineradoras de pagarem essa tributação sobre produtos primários e semielaborados (entre eles, os minérios), reforçará o déficit fiscal dos estados brasileiros.
Ou seja: além de não enfrentar a verdadeira causa do aumento abusivo no preço dos combustíveis, a redução irresponsável da principal fonte de receitas dos estados provocará cortes orçamentários extremamente prejudiciais à população brasileira, que além de já sofrer com o aumento vertiginoso dos combustíveis, enfrenta a alta dos preços nos alimentos e a redução dos investimentos em educação e saúde.
Se a política tributária nacional continua a ser norteada pelo beneficiamento dos empresários, a quem interessa a diminuição, ou até mesmo, a isenção do ICMS? Na avaliação do cientista social e professor da Universidade Federal de Viçosa, Tádzio Coelho, a redução do ICMS possui uma duração curta de vida, já que é uma medida tomada em ano de eleições decisivas para nosso país e que, portanto, tem por objetivo conter a avaliação negativa do atual governo e ainda contribui para o processo de crise fiscal dos estados.
“É previsível que a isenção do ICMS da gasolina sobreviva até o fim das eleições, mas é uma medida que visa as eleições e coloca em maus lençóis os governos estaduais. O ICMS é basicamente um tributo de incidência estadual, claro que isso chega até os municípios devido aos repasses, mas o fato é que hoje os estados vivem uma crise fiscal no Brasil devido a essa balança desigual dos tributos. Então, acredito que essa medida eleitoreira irá contribuir para essa crise”, afirma Tádzio.
Mas afinal, como funciona esse tipo de arrecadação?
O ICMS contribui diretamente para os direitos básicos da população, sendo 25% dos recursos destinados à educação, 15% para saúde e outros 25% vão para os municípios, de acordo com a Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco).
Os estudos técnicos já apontam que o projeto vai retirar, em um ano, R$ 90,5 bilhões dos estados, sendo R$ 11 bi do SUS, R$ 21 bi do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e R$ 5 bi do Fundo de Combate à Pobreza.
Para o auditor-fiscal e presidente da Fenafisco, Charles Alcântara, a medida, além de não resolver o problema inflacionário do país, não entregará à população combustível a preço justo.
“A drástica redução do ICMS não entregará o benefício prometido ao consumidor final, já que o preço do combustível no Brasil é fortemente afetado pelo mercado e moeda internacionais, assim como pelos indecorosos dividendos pagos pela Petrobras aos acionistas privados”, explica Alcântara.
E, de fato, não é a primeira vez que o governo federal tenta conter a inflação dos combustíveis através desta, por assim dizer, “manobra”: em 2021 a cobrança do ICMS teve seu valor congelado, o que não freou o aumento dos preços no setor.
“Em um país que volta a sofrer com a fome, com 33 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar, é necessária uma reforma tributária pensada na perspectiva do desenvolvimento, que revise os incentivos fiscais e que corrija as iniquidades do sistema de impostos, ou seja, suas injustiças, além de combater o abismo da desigualdade social”, afirma o auditor.
Edição: Raquel Monteath (Coletivo de Comunicação Nacional do MAM)
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