Em sentença proferida no dia 12 de agosto, a 9ª Vara Federal de Porto Alegre julgou procedente a Ação Civil Pública proposta pelo Instituto Preservar, pela Cooperativa Agroecológica Nacional Terra e Vida (Coonaterra/ BIONATUR), pelo Centro de Educação Popular e Pesquisa em Agroecologia (CEPPA), pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN) e pelo Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (INGÁ).
A sentença reconheceu os diversos vícios que permeiam o processo de licenciamento ambiental da Usina Termelétrica Nova Seival, nos municípios de Candiota e Hulha Negra, no Rio Grande do Sul e determinou a suspensão do processo de licenciamento ambiental desta UTE, até que sejam sanados os vícios do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) apontados pelo IBAMA e pelos diversos pareceres técnico-científicos apresentados no processo.
Ainda, anulou a audiência pública virtual realizada no dia 20 de maio de 2021, e determinou a realização de, ao menos, três audiências públicas em substituição da anulada, na modalidade presencial ou híbrida, em Porto Alegre, Hulha Negra ou Candiota e Bagé. No entanto, para poder agendar uma nova audiência, é necessário que haja análise técnica e merital do IBAMA sobre o EIA/RIMA, o Estudo de Análise de Risco e as conclusões técnicas apresentadas pelos autores.
Também determinou a inclusão nos Termos de Referência que tratam dos processos de licenciamento de Usinas Termelétricas no Rio Grande do Sul das diretrizes legais previstas na Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), Lei n. 12.187/09 e das diretrizes da Lei Estadual n. 13.594/10, que criou a Política Gaúcha sobre Mudanças Climáticas (PGMC), sobretudo quanto à necessidade de realização de Avaliação Ambiental Estratégica, nos termos do art. 9 da referida Lei Estadual, e a necessidade de inclusão de análise de riscos à saúde humana.
“Esta exigência torna a decisão da 9ª Vara Federal de Porto Alegre um importante marco na litigância climática no país, consolidando a necessidade de incorporação, nos Termos de Referência do IBAMA para licenciamentos de termelétricas, do componente climático, da avaliação ambiental estratégica e dos riscos desta atividade à saúde humana”, afirma a advogada popular Alice Hertzog Resadori (RENAP), que assessora as entidades autoras da ação.
A Copelmi e a Energia de Campanha são as empresas responsáveis pelo projeto da Usina Termelétrica (UTE) Nova Seival, que previa a construção de uma usina termelétrica, com geração de 726 megawatts de energia a partir do carvão da Mina do Seival. Para viabilizar o processo termelétrico a UTE Nova Seival necessita consumir 1.595 m³/h de água para realizar suas atividades, ou seja, a termelétrica consumiria 38.280m³ por dia, em uma região em que a escassez de água é um problema recorrente e que pode inviabilizar a continuidade da produção agrícola da região.
Esse aspecto é crucial e demonstra a gravidade dos impactos gerados pela UTE, visto que essa média de consumo hídrico (38.280m³ por dia) equivale ao consumo diário de um município de cerca de 230 mil habitantes; quase 8 vezes o consumo diária de água de todo o município de Candiota ou o equivalente ao dobro do consumo diário de água de uma cidade como Bagé, conforme dados disponibilizados no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).
O EIA/RIMA não se encontrava apto à disponibilização para consulta e manifestação da sociedade em audiência pública, uma vez que “diversos impactos e informações ambientais haviam sido omitidos, como demonstrado pela análise do processo de licenciamento ambiental e corroborado por pareceres técnico-científicos juntados pelos autores, evidenciando a violação do direito à participação da sociedade e de normas básicas que regem o licenciamento ambiental”, destaca o advogado Marcelo Mosmann.
Essa é uma decisão que favorece também a proteção de centenas de famílias assentadas entre a região de Candiota/Hulha Negra, além do Centro de Educação Popular e Pesquisa em Agroecologia (CEPPA) e a Cooperativa Bionatur, principal referência em pioneirismo na produção de sementes agroecológicas aqui no Brasil, todos ligados ao MST. Eles seriam diretamente afetados pela barragem que seria construída para viabilizar o empreendimento da Copelmi e sequer eram mencionados nos estudos apresentados pelas empresas.
Diante disso, a sentença proferida pela Justiça Federal “consagra uma importante vitória da sociedade civil organizada pelo Comitê de Combate à Megamineração (CCM/RS), pois obriga a análise do componente climático para efetivamente proteger a natureza, os agricultores/as e os territórios que produzem sementes agroecológicas naquela região do RS e reconhece que a tentativa de aprovação do licenciamento ambiental estava sendo feita de maneira irregular”, ressalta o advogado Emiliano Maldonado.
Comentários