Na abertura do Encontro Estadual da Bahia o tema da soberania foi colocado como central para mudanças

Por: Rebeca Bastos da AATR

 

A abertura do 1º Encontro Estadual do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM-BA) foi marcado pela pluralidade de ideias e pela organizações críticas ao atual modelo de exploração dos minérios.

A partir do tema central, “Os desafios estratégicos para a construção de soberania popular na mineração”, os debatedores da mesa contextualizaram o cenário alarmante de desrespeito à legislação ambiental e violações aos direitos nos territórios atingidos pela mineração no estado da Bahia, que está entre os três estados brasileiros mais minerados, ficando atrás apenas do Pará e de Minas Gerais.

Na ocasião, foram expostos ainda dados sobre as transformações destrutivas dos ecossistemas, riscos à saúde dos moradores do entorno das atividades e violações trabalhistas das empresas. O encontro é culminância de um processo longo com os territórios, que envolveu debates nas comunidades e levantou problemas e soluções. “Aqui estamos unificando pautas que já estão em andamento. O outro objetivo é articular um projeto de soberania na mineração societária”, resumiu Simone Jesus, que integra a Direção Nacional do MAM – BA e ficou responsável pela abertura da mesa.

Simone Jesus (Direção Nacional do MAM -BA), Charles Trocate (Direção Nacional do MAM – PA), Beni Carvalho (Comissão Pastoral da Terra – CPT) Foto: Helenna Castro (Comissão Pastoral da Terra – BA)

“O modelo da mineração é incompatível com a vida. Na América Latina como todo, mas na Bahia ainda mais, porque a gente tem essa característica do semiárido, que é uma contradição muito grande com o modelo de mineração, a forma como usam a água, que é uma distância muito grande do que as populações usam”, aponta Simone que acredita que ainda há um longo caminho a ser percorrido para que as comunidades possam conviver com o minério.

Já Charles Trocate, que faz parte da Diretoria Nacional do MAM- PA destacou em sua fala que a situação de exploração predatória não é novidade no país, mas que as táticas são sempre atualizadas, o que exige dos movimentos sociais uma renovação constante. “Atualmente estamos sendo tomados pelo discurso de mudanças por causa da crise climática, mas a rotina capitalista continua a mesma:  extrai, transforma, consome e descarta. O que  chamam de rolagem perpétua. Por trás dessa rotina está o Estado que objetifica, cientifica e precifica a natureza”. Para ele, é muito importante evocar a regulação da natureza sob uma ótica que não seja nem a do Estado, nem a dos exploradores. “Essa luta inclui várias outras como o controle popular do mineral, a oneração dos minérios”, exemplificou.

Beni Carvalho, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), levantou a problemática da evasão dos minérios brasileiros através da exploração de empresas estrangeiras instaladas no território nacional que reproduzem a lógica “primário/exportadora” que leva o lucro para fora do país, mas o passivo ambiental fica com o povo brasileiro. Em sua fala, ele também contextualizou que a origem do problema do minério tem bases no colonialismo. “Apenas o povo, a classe trabalhadora é que pode derrubar esses interesses pela soberania popular”.

Violações na prática

Conforme Relatório Anual de Conflitos da Mineração no Brasil de 2022, publicação do Observatório dos Conflitos da Mineração no Brasil e do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, a Bahia é o quarto estado com conflitos ligados à exploração mineral. A relação fica ainda mais perigosa quando se trata de territórios e comunidades quilombolas, que represam 25% das ocorrências, o que representa quase 50 mil pessoas ameaçadas.

Maria Cleide Souza é moradora do distrito Guirapá no município de Pindaí que convive com a prática danosa da mineração há quase 20 anos. Ela participa das atividades do MAM por reconhecer que a causa é necessária para que a comunidade e o ecossistema também possam ganhar. “Desde quando a Bamin chegou no território a nossa vida mudou pra pior, minha família foi deslocada, não temos mais saúde, a indenização foi insuficiente e não conseguimos mais ganhar dinheiro com nosso trabalho”. Segundo o relato de Cleide a insatisfação é compartilhada com os outros moradores, pois a empresa chegou fazendo promessas de prosperidade e não cumpriu nenhum dos acordos e promessas.

Esta primeira edição do encontro foi articulada para compartilhar os desafios da luta do povo na mineração, além de fortalecer a unidade e cooperação entre as populações afetadas, entidades parceiras e a sociedade civil e visibilizar o debate do avanço da mineração no estado.

 

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração e AATR- Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais.