MAM promove discussões sobre racismo ambiental e mineração na capital paraense

Por: Giselle Palheta e Jerê Santos

 

Nos dias 21 e 22 de novembro, o Coletivo Estadual de Negritude do MAM – PA, junto à Associação de Docentes da UFPA (ADUFPA) promoveram dois dias de atividade na Casa do Professor em Belém (PA). Com o tema: “Negritude como Ponta de Lança no Enfrentamento do Problema Mineral”. O evento tratou de temas relacionados ao Racismo Ambiental, Arte e Cultura contra o Imperialismo, Letramento Racial e Branquitude, contou com o lançamento do clipe e do documentário “Soberania Popular” do rapper e militante do MAM Prog Mc, além do lançamento do Livro “Búfalo Antigo ou Gabriel e outras orquídeas no bolso” de Charles Trocate. O espaço teve presença de professores da UFPA, artistas e militantes do movimento tanto de Belém quanto Igarapé-Miri, Marabá, Abaetetuba, Barcarena, Moju. Além de representantes do Centro de Defesa do Negro do Pará (CEDENPA) e lideranças quilombolas. Configurou-se como um espaço de diálogo sobre as experiências de resistência negra travadas no estado, tendo o racismo ambiental como mote.

Discutir a questão racial na perspectiva de sua íntima relação com o problema mineral brasileiro é imprescindível para a compreensão de sua história e dinâmicas atuais. A exploração mineral no Brasil remonta ao período colonial, da forma como o país foi, historicamente, explorado com uso de mão de obra escravizada do continente africano. As incursões dos bandeirantes nesse território desde o século XVII já possuíam a busca por metais raros como um dos seus principais impulsos. O chamado “ciclo do ouro” (1690-1750) somou-se a escravidão de negros e indígenas sistema econômico colonial. 

A partir de então, o avanço da exploração mineral tornou-se exponencial até os dias atuais, mas manteve características nas quais o racismo é preponderante. De acordo com levantamento do Instituto Alma Preta Jornalismo, por volta de 83% dos municípios brasileiros com barragens de mineração em situação de alerta ou de emergência possuem maioria populacional de pessoas negras. Somam-se a isso os recorrentes casos de tragédia ambiental, onde a maioria das pessoas atingidas é preta/parda, como no caso de Mariana-MG, por exemplo. Dessa forma, torna-se inescapável tal discussão que vise a soberania popular na mineração, considerando a dimensão racial desse problema do qual é inseparável.

A existência das contradições da exploração mineral revela então continuidades de um sistema econômico que é, essencialmente, colonizado. A permanência estrutural dessas contradições se materializa, sobretudo, na vida das pessoas negras afetadas em diferentes níveis pela atividade minerária. Sumano MC, artista e militante do MAM, ressaltou a importância de discutir essas temáticas: “A atividade é de extrema importância para nossa juventude, mas não só para a juventude, para a região como um todo, pois sabemos que as contradições do modelo mineral no Brasil estão situadas principalmente nas comunidades periféricas onde se encontra pessoas pretas e originárias.” 

No contexto da atividade de formação e debates, o tema da arte e cultura também foi trazido, enfatizando experiências e perspectivas da militância cultural e atividade artística realizada por pessoas pretas, dos interiores e periferias do estado. Dando ênfase às contradições no que diz respeito a atuação das empresas mineradoras no patrocínio de eventos artísticos e culturais, a exemplo do patrocínio da Vale S/A e Hydro ao Círio de Nazaré, entre outros espaços de fazer artístico. Para se ter uma medida de tal contradição, de acordo com a própria Vale, em 2023 foram destinados mais de R$ 221 milhões para projetos culturais através do Instituto Cultural Vale para todas as regiões do Brasil. Entretanto, o debate sobre arte e cultura no formato trazido pelas empresas mineradoras aparentam um aspecto mitigador que, na prática, se consolida como uma forma de reparação à própria imagem da empresa. Sendo que, de acordo com a CPI da Vale na ALEPA, as manobras da empresa para evitar a tributação resulta em déficit na casa de R$7 bilhões, apenas no Pará, de acordo com Fillipe Bastos, pesquisador e consultor da CPI. Denota-se, a partir da inserção de grandes mineradoras no mercado cultural e da arte, uma disputa pelo discurso sobre o real impacto da atividade de mineração no modelo atual. 

A ênfase do coletivo e as discussões que ocorreram durante o evento se deram no sentido de demonstrar os desafios de se contrapor a esse modelo, tendo a arte e cultura como pontos de resistência diante da guerra ideológica travada contra o lobby das grandes mineradoras. 

Durante a programação também ocorreu o lançamento do documentário, videoclipe e música intitulado “Soberania Popular”, do rapper e militante do MAM Prog MC. Na descrição da música, o artista fala sobre como essa produção é um manifesto frente aos projetos de destruição das mineradoras: “Muitos rostos, muitas vozes, essa música é um manifesto sonoro, um grito frente ao algoz – grandes empreendimentos que destroem as comunidades no Pará, os quais contaminam os rios, as matas e o ar, tudo o que pra nós é vida. Hidrovia, mineradora genocida, não me intimido, intimidade é nós que tem com esse lugar. Contra o Imperialismo, Soberania popular na Amazônia!”. Acesse o videoclipe aqui.

Por fim, ocorreu o lançamento do livro “Búfalo Antigo ou Gabriel e outras orquídeas no bolso”, de Charles Trocate, dirigente Nacional do MAM. O escritor fala da importância do lançamento em Belém: “Esse livro tem um lugar, ele é amazônico, esse livro tem uma casa, o Pará, e esse livro tem muitas paisagens como a cidade de Belém e sua gente, por isso eu fiquei muito alegre, muito contente de poder realizá-lo em Belém e, sobretudo, nesse período, porque esse livro é uma floresta sonora. E debaixo dessa floresta, entre essa floresta, tem gente que me pertence e que tem pertencimento a esse livro”. O livro foi lançado nas capitais Fortaleza e Salvador e, agora, em Belém, cidade que também é sede da Secretaria Nacional do Movimento. Também será lançado esse mês no Rio Grande do Sul e em São Paulo no mês de dezembro.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração