Jerê Santos (Coletivo de Negritude – MAM Pará)
Situado na região central do continente africano, a República Democrática do Congo (RDC, antes Zaire) passa há décadas por conflitos armados que, no seu interior, são motivados pela exploração mineral, onde há grande presença de minérios considerados estratégicos como coltan, cobalto e lítio. O conflito já provocou a morte de mais de 6 milhões de pessoas, sendo considerado o mais sanguinário desde a Segunda Guerra.
Um dos principais movimentos acusados de instigar e efetuar massacres na região, o Movimento 23 de Março (M-23), uma milícia rebelde de oposição ao governo da RDC, justifica suas ações baseadas na defesa dos tutsis congoleses, minoria étnica que fugiu para o país devido a guerra civil de Ruanda. Paul Kagame, presidente de Ruanda há 24 anos e pertencente a etnia tutsi, foi um dos fugitivos que se refugiaram em Uganda e cujo governo é acusado de financiar e alimentar os massacres do M-23.
A disputa pelo território tem causado deslocamentos em massa nas províncias e milhões de mortes. Os conflitos se dão principalmente nas províncias de Kivu do Norte e Kivu do Sul, próximos a fronteira com Ruanda e Uganda, e teve escalada recente devido a tomada de Goma (capital de Kivu do Norte) e Bukavu pelo M-23.
As economias ocidentais absorveram minerais dessas áreas invadidas através de suas empresas transnacionais e, apenas em 2025, o Parlamento Europeu instou a Comissão Europeia a “suspender e a rever de imediato e de forma transparente o memorando de entendimento entre a UE e o Ruanda sobre matérias-primas críticas, tendo em conta o papel do Ruanda na desestabilização da RDC”. Entretanto, ficam dúvidas se essas medidas, além de tardias, podem de fato lidar com o problema, dada a fragmentação do multilateralismo e da própria União Europeia.
O contexto dos conflitos na República Democrática do Congo revela o aspecto transnacional do problema mineral e suas contradições. A presença de minerais que são considerados estratégicos para a transição energética e são disputados pelas principais potências, são também foco de especulação do capital que fomenta tais conflitos para favorecer o intercâmbio desigual existente no sul global. Expressa, também, o papel da política imperialista, quando constitui economias periféricas e dependentes, tendo como objetivo a aniquilação de condições de exercício de soberania. Sendo que, nos momentos de crise como a atual etapa histórica, parte do imperialismo a necessidade de aprofundar os mecanismos de expropriação e, por isso, a violência sobre os povos e a natureza.
A transição energética, da forma como é projetada pelos interesses capitalistas, se materializa na morte de milhões, no saque de bens naturais e o desrespeito à soberania e autodeterminação dos povos sobre os seus territórios. A denúncia ao que ocorre na RDC é necessária devido a grave crise humanitária, e por indicar um caráter profundamente colonialista das relações do capitalismo mundial com o continente africano.
A exploração dos bens naturais às custas de vidas humanas é uma face cruel do capitalismo que se manifesta especialmente nos povos expropriados, cujas estruturas se mantém essencialmente colonialistas. Daqui do Brasil, o MAM se solidariza com o povo congolês e se compromete a apoiar e continuar a luta por soberania popular na mineração, por um equilíbrio de economia, natureza e sociedade.
Referências
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Parlamento Europeu pede suspensão do acordo UE-Ruanda de matérias-primas. Notícias ao Minuto. 13 fev. 2025. Disponível em Parlamento Europeu pede suspensão do acordo UE-Ruanda de matérias-primas Acesso em 18 fev. 2025.
Movimento pela Soberania Popular na Mineração
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