Moradores denunciam que projeto pode prejudicar abastecimento de água na cidade e afetar a produção no campo
Está em discussão um Projeto de Lei (PL) de revisão do Plano Diretor do município do Serro, região centro-nordeste de Minas Gerais. O Plano foi elaborado, a pedido da prefeitura, pela Fundação Israel Pinheiro, a partir de oficinas participativas e consultas a comunidade serrana. O projeto foi mostrado no ano passado à comunidade e apresentava restrições à atividade mineradora.
Durante todo o ano de 2018, a empresa Herculano Mineração tem pressionado a alteração do projeto de Plano Diretor para viabilizar a abertura de uma mina de minério de ferro. Essa movimentação da empresa se deve à sua aquisição dos direitos minerários de uma área no município que pertencia à multinacional Anglo American. Desde então, a mineradora passou a pressionar os vereadores para alterarem o projeto do Plano Diretor, para que fosse possível a implantação de seu empreendimento minerário. O projeto chegou a retornar para a Fundação Israel Pinheiro com o argumento de que deveriam ser feitas alterações no texto.
“A proposta foi aprovada sem que nenhuma pessoa tivesse apresentado qualquer objeção. Assim, repudio a postura de alguns vereadores, que, de modo irracional e antidemocrático, protegem os interesses particulares de uma empresa contra o bem comum, que é garantir a todos os serranos o acesso à água”, questiona Matheus de Mendonça Gonçalves Leite, professor de Direito da PUC Minas.
As intenções da empresa têm causado grandes contestações já que a área requerida se localiza em um lugar cercado de nascentes que contribuem para a formação de duas microbacias hidrográficas, sendo que uma delas, a do Rio do Peixe, é responsável pelo abastecimento de água da cidade do Serro. Devido a essa importância hídrica, o projeto do Plano Diretor restringe a atividade minerária nessas áreas, permitindo apenas atividades de baixo impacto para não comprometer a segurança hídrica da cidade.
Para Lucas Bittencourt, geógrafo e professor da rede estadual, não é a primeira vez que o município do Serro está ameaçado por um projeto de grande porte de mineração de ferro. Ele relata que, em 2014, o município vivenciou a mesma movimentação. “Naquele ano a empresa Anglo American solicitou para a prefeitura uma certidão de conformidade de um projeto na mesma área requerida atualmente pela Herculano. Na época, o Conselho Municipal de Meio Ambiente (CODEMA) emitiu parecer contrário à implantação do empreendimento, devido à importância hídrica da região e as inúmeras inconsistências no EIA/RIMA do projeto, como o não reconhecimento da comunidade Quilombola de Queimadas”, explica Bittencourt.
No dia 28 de setembro, está agendada uma audiência pública para apresentação da minuta de revisão do Plano Diretor do município, fruto da reivindicação da mineradora que pretende a alteração de dispositivos que permitam a instalação de seu projeto. A audiência será realizada na Escola Municipal Irmã de Carvalho, às 18:30.
Comunidades anunciam resistência
As comunidades rurais próximas à área do projeto minerário estão se mobilizando contra o empreendimento. Segundo Juliana Stelzer, dirigente do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), desde a retomada da discussão sobre a instalação da mineração na região o povo vem se organizando para impedir esse retrocesso. Nos anos de 2017 e 2018 foram realizadas reuniões e assembleias populares nas comunidades para debater os impactos da mineração. “É um consenso de que o projeto da Herculano não é bem-vindo. O povo reivindica melhorias nas águas, no trabalho e fomento para agricultura familiar e não esse projeto de destruição proposto pela mineradora”, denuncia Stelzer.
A mineração no Serro tem mobilizado as comunidades rurais e tem preocupado também a população urbana, uma vez que boa parte do abastecimento hídrico do município é oriundo das comunidades rurais ameaçadas pelo projeto minerário. “Caso a Herculano venha a se instalar poderá afetar nossas águas e até prejudicar práticas artesanais no campo, como a produção do queijo. O povo não aceitará esse retrocesso e lutaremos como for preciso para fazer valer nossas vontades e direitos”, anuncia Stelzer.
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