A Câmara analisa nesta quarta-feira (20) um dos principais pontos do ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que prevê o fim das desonerações fiscais. No mesmo dia, um manifesto assinado por entidades sociais como CUT e MST, acadêmicos, senadores, jornalistas e petistas como Tarso Genro e Valter Pomar, critica a solução que o governo apontou para recuperar a economia.
O ajuste fiscal, segundo o manifesto, “além de insuficiente, pode deteriorar ainda mais o quadro econômico brasileiro”. Como afirmam os críticos, que defendem, ainda, uma saída da crise pela esquerda, “o quadro de desequilíbrio fiscal das contas do governo não é responsabilidade dos mais pobres, trabalhadores, aposentados e pensionistas”.
Leia a íntegra do manifesto:
Manifesto pela mudança na política econômica e contra o ajuste
O Brasil mudou nos últimos anos. Houve redução do desemprego e melhoria da renda do trabalhador. Milhões de brasileiros saíram da pobreza extrema e outros tantos conquistaram a casa própria. Além disso, milhões ingressaram e concluíram o ensino superior e o ensino técnico. Foram também iniciados e concluídos importantes projetos de infraestrutura.
Vivemos um período importante na trajetória desse projeto de mudança. Depois de 12 anos, o país passa por um momento extremamente difícil. O governo parece encurralado e não demonstra capacidade de ampliar o horizonte político de um projeto que fez o Brasil avançar. O país precisa reencontrar o caminho do desenvolvimento e construir uma estratégia política capaz de enfrentar os novos desafios.
Um pressuposto fundamental desta estratégia política deve ser o crescimento, com proteção dos empregos, evitando que o Brasil mergulhe numa recessão que se avizinha. No entanto, a posição do governo, expressa pelo Ministério da Fazenda, está concentrada exclusivamente numa política de ajuste fiscal, que além de insuficiente, pode deteriorar ainda mais o quadro econômico brasileiro.
Ajuste fiscal recessivo
O governo diz para a sociedade que a MP 665 ataca uma distorção no gasto das políticas de proteção ao trabalhador formal e que a MP 664 corrige abusos e fraudes. No entanto, admite publicamente, especialmente quando se dirige ao mercado financeiro, que essas medidas fazem parte de um ajuste fiscal.
Dados do Dieese estimam que, com a proposta original do governo na MP 665, mais de 4,8 milhões de trabalhadores não poderiam acessar o seguro-desemprego (38,5% do total de demitidos sem justa causa em 2013) e 9,94 milhões de trabalhadores perderiam o abono salarial. Com as alterações nas MPs na Câmara dos Deputados, que diminuíram o impacto fiscal, o governo anuncia que aumentará o corte no orçamento dos ministérios e elevará impostos.
O quadro de desequilíbrio fiscal das contas do governo não é responsabilidade dos mais pobres, trabalhadores, aposentados e pensionistas. As causas desse desequilíbrio foram a desoneração fiscal de mais de R$ 100 bilhões, concedida pelo governo às grandes empresas, as elevadas taxas de juros Selic, que transferem recursos para o sistema financeiro, e a queda da arrecadação devido ao baixo crescimento no ano passado.
Não é justo, agora, colocar essa conta para ser paga pelos mais pobres que precisam de políticas públicas, trabalhadores, aposentados e pensionistas. Enquanto o andar de baixo perde direitos, não está em curso nenhuma medida do governo para tornar o nosso sistema tributário mais progressivo. Dados do especialista em finanças Amir Khair apontam que a taxação sobre as grandes fortunas pode render até R$ 100 bilhões por ano. Onde está a parcela de contribuição dos bancos e dos mais ricos?
Para agravar a situação do país, associado ao arrocho fiscal, vem um aperto monetário, que enfraquece a economia e anula o seu próprio esforço fiscal. O governo já aumentou em 2% a taxa de juros Selic neste ano, beneficiando apenas os especuladores do mercado financeiro. A cada aumento de 0,5 ponto porcentual da taxa Selic durante o ano, o gasto público cresce de R$ 7,5 bi a R$ 12 bi. No ano passado, os gastos públicos com juros foram superiores a R$ 300 bilhões.
Enquanto os recursos públicos pagos pelos impostos descem pelo ralo do mercado financeiro, o governo vai cortar direitos dos trabalhadores para economizar R$ 10 bi com essas MPs. Além disso, ameaça vetar a mudança do Fator Previdenciário, que beneficia os aposentados e é defendida pelas centrais sindicais, como se as contas públicas fossem quebrar…
Só com crescimento haverá equilíbrio fiscal e desenvolvimento
Mudar o rumo da política econômica é colocar o crescimento como um aspecto central, porque os números sinalizam uma desaceleração muito forte da economia. Os investimentos do governo federal estão parando. O desemprego cresce mês após mês. A renda do trabalhador também está em trajetória de queda. A arrecadação do governo federal está caindo.
Só com o crescimento econômico poderemos recuperar o equilíbrio das contas públicas. O resultado fiscal é sempre o reflexo da saúde de uma economia. Uma economia estagnada gera um orçamento desequilibrado. Durante o governo de FHC, sua equipe econômica promoveu corte de gastos e contingenciamentos. Mesmo assim, o déficit nominal foi de 5,53% do PIB em oito anos. A dívida pública como proporção do PIB cresceu de 30,6%, em 1995, para 60,4%, em 2002.
Uma economia forte e dinamizada produz aumento da arrecadação, e o resultado é o equilíbrio fiscal. Durante o segundo governo do presidente Lula, a economia cresceu em média 4,7% ao ano e a dívida pública caiu como proporção do PIB de 45,5%, em 2007, para 39,2%, em 2010. E como resultado do crescimento econômico de 7,6%, em 2010, o déficit nominal foi reduzido para 2,5% do PIB.
É hora de radicalizar o projeto de desenvolvimento, com o fortalecimento da produção, investimentos na indústria nacional e na agricultura, desenvolvimento de pesquisa, ciência e tecnologia e dinamização do mercado interno. Enquanto o país se submeter aos interesses do capital financeiro e estiver dependente da dinâmica imposta pelos países avançados, especialmente em relação a ciência e tecnologia, nossa economia estará fragilizada.
O salto que precisamos dar na economia implica uma nova estratégia política para enfrentar a avalanche regressiva, que avança tanto na área do trabalho, com o projeto de terceirização, como na esfera dos valores da sociedade, dando espaço a uma onda conservadora que prega a redução da maioridade penal, a flexibilização do Estatuto do Desarmamento, a aprovação do Estatuto da Família, a PEC 215 e a eliminação da rotulagem dos alimentos transgênicos. No campo político, avança a legalização do financiamento empresarial de campanhas eleitorais, dentro de uma contrarreforma política que agravará os problemas no nosso regime democrático.
A fragilidade do governo no Congresso Nacional demonstra que é necessário, mais do que nunca, construir uma nova governabilidade, com as forças progressistas, como as centrais sindicais, movimentos populares, organizações de juventude, cultura e mídia alternativa, para enfrentar a ofensiva neoliberal, que avança ao lado de uma onda conservadora.
O ajuste fiscal, nos termos em que está sendo proposto, coloca o governo contra as forças progressistas, enfraquecendo a capacidade de um salto político. É necessário reagir e colocar em andamento uma nova agenda política, ombro a ombro com as forças democráticas e populares, os movimentos sociais organizados e os partidos políticos – comprometidos com o desenvolvimento inclusivo do país, a soberania nacional e a retomada do crescimento, com a garantia do emprego – que atuam de forma autônoma parar ampliar o horizonte político.
A proposta de ajuste fiscal apresentada pelo governo trava o país diante da possibilidade de uma nova fase de desenvolvimento e da construção de uma nova estratégia política. O Brasil progrediu nos últimos 12 anos, mas a continuidade desse projeto depende de retificações. Essa proposta de ajuste fiscal não combina com os novos desafios. Combina apenas com o passado. Portanto, quem quer dizer SIM ao desenvolvimento com justiça social tem que dizer NÃO ao arrocho fiscal, nos termos propostos pelo governo.
20 de maio de 2015
Personalidades:
Alfredo Saad Filho – professor de economia política da Universidade de Londres
Anivaldo Padilha – líder Ecumênico
Armando Boito Jr. – professor de ciência política da Unicamp
Breno Altman – jornalista, diretor do site Opera Mundi
Cândido Grzybowski – diretor do Ibase
Dermeval Saviani – professor emérito da Unicamp e pesquisador emérito do CNPq
Eleuterio Prado – professor sênior da área de economia da USP
Gilberto Maringoni – relações internacionais (UFABC)
Heloísa Fernandes – socióloga, professora da USP e da ENFF
João Pedro Stédile – MST/Via Campesina
João Sicsú – economista e professor UFRJ
Jorge Matoso – economista, professor aposentado do Instituto de Economia da Unicamp; foi presidente da Caixa Econômica Federal (2003-2006)
José Carlos de Assis – economista, doutor em engenharia de produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
José Gomes Temporão – ex-pesquisador da Fiocruz e ex-ministro da saúde (2007-2010)
José Juliano de Carvalho Filho – economista – professor doutor FEA/USP
Ladislau Dowbor – economista e professor da pós-graduação na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)
Laura Tavares – Flacso Brasil
Leda Maria Paulani – professora titular do Departamento de Economia, FEA-USP
Lisete Regina Gomes Arelaro – professora do Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação da Feusp
Luiz Alfredo Salomão – diretor da Escola de Políticas Públicas e Gestão Governamental; foi subchefe executivo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência
Luiz Gonzaga Belluzzo – professor titular do Instituto de Economia (IE) da Unicamp
Marcio Pochmann – professor do Instituto de Economia da Unicamp, ex-presidente do Ipea no governo Lula
Odilon Guedes – economista; diretor do Sindicato dos Economistas no Estado de São Paulo
Pedro Paulo Zahluth Bastos – professor associado (livre docente) – Instituto de Economia (Unicamp)
Ricardo Summa – professor doutor do Instituto de Economia da UFRJ
Samuel Pinheiro Guimarães Neto – diplomata brasileiro, foi secretário-geral das Relações Exteriores do Ministério das Relações Exteriores e ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) no Governo Lula
Tarso Genro – ex-governador do Rio Grande do Sul
Valter Pomar – professor universitário e militante do Partido dos Trabalhadores
Adelaide Gonçalves – historiadora, universidade federal do ceará
Ailton Cotrim Prates – professor assistente na UFAL/Arapiraca
Antonio José Alves Junior – professor associado II da UFRRJ
Alvaro Britto – comissão de ética do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro – coordenador do curso de jornalismo do Centro Universitário de Barra Mansa
Amália Catharina Santos Cruz – professora, Uneb/Dcvh Iv
Ana Corbisier – socióloga
Ana Costa – professora da UFF/RJ
Andrea Caldas – setor de educação, UFPR
Angela Maria Carvalho Borges – pós-graduação em políticas sociais e cidadania/ UCSal – Bahia
Anivaldo Padilha – líder ecumênico
Artur Machado Scavone – jornalista
Bruno Elias – secretário nacional de movimentos populares do PT
Carlos Roberto Colavolpe – professor associado III Facde/UFBA
Carolina Nozella Gama – Universidade Federal de Alagoas/pós-graduação da Universidade Federal da Bahia
Celi Zulke Taffarel – professora Dra. titular na Faced, UFBA
Cesar Cordaro – Comitê Paulista Pela Memória, Verdade e Justiça (CPMVJ)
Cesar Sanson – professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Diana Cohen – assessora da Comissão da Memória e Verdade, São Paulo
Fabiano Abranches Silva Dalto – professor de economia da Universidade Federal do Paraná
Fernando Augusto M. Mattos – UFF, Faculdade de Economia
Gilson de Góz Gonzaga – Operário de fábrica e militante do PT
Giovane Zuanazzi – diretor de movimentos sociais da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES)
Giucelia Figueiredo – presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-PB)
Gláucia Campregher – professora de economia (UFRGS)
Henrique Novaes – professor Unesp/Marília
Inês Patrício – professora de economia da UFF
Isabel Lustosa – cientista política e historiadora, da Fundação Casa de Rui Barbosa
Jayr Lemos de Almeida – técnico agrimensor
Joilson Cardoso – vice-presidente nacional da CTB; secretário nacional da Sindicalismo Socialista Brasileiro (SSB)
José Heleno Rotta – professor de economia, aposentado da UFCG
Lazaro Camilo Recompensa Joseph – professor da Universidade Federal De Santa Maria
Luiz Carlos Gabas – Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Comissão de Incidência Pública da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil e Centro de Direitos Humanos de Cascavel (PR)
Luiz Martins de Melo – professor associado IV do IE/UFRJ
Ligia Maria de Godoy Batista Cavalcanti – juíza de Direito – Natal/RGN
Marcio Sotelo Felippe – ex-Procurador Geral do Estado de São Paulo, membro da Comissão da Verdade da OAB-Federal
Marcos Corrêa Da Silva Loureiro – professor da UFG – Goiânia (GO)
Maria Aparecida Dellinghausen Motta – editora Autores Associados
Mário Jorge da Motta Bastos – professor associado na Universidade Federal Fluminense
Marta Skinner – Uerj, professora universitária
Mary Garcia Castro – União Brasileira de Mulheres
Miriam Abramovay – coordenadora da área de juventude e políticas públicas (Flacso)
Nancy Cardoso – pastora metodista, graduada em teologia e filosofia, mestra e doutora em ciências da religião
Rafael Litvin Villas Bôas – professor da UnB
Raimundo Bertuleza (Poty) – poeta e militante sindical
Raimundo Bonfim – coordenador geral da Central de Movimentos Populares (CMP-SP)
Rennan Moura Martins – jornalista, editor do Blog dos Desenvolvimentistas
Ricardo Buratini – economista
Ricardo Fernandes de Menezes – médico sanitarista, Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo
Robson Amâncio – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Humanas e Sociais Departamento de Ciências Sociais
Robson Dias da Silva – economista, professor adjunto (UFRJ)
Roberta Calixto – designer, militante feminista e do Partido dos Trabalhadores
Rodrigo Sérvulo da Cunha – advogado e cientista social, presidente do Coletivo Advogados para a Democracia
Rogério Correia de Moura Baptista – deputado estadual
Sandro Conceição de Matos – professor de biologia
Suely Farah – professora PMSP
Vanessa Petrelli Corrêa – professora titular do Instituto de Economia – Universidade Federal de Uberlândia
Zilda Márcia Grícoli Iokoi – professora titular do Departamento de História da Universidade de São Paulo
Entidades:
Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Movimento dos trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
Articulação dos Empregados(as) Rurais (Adere)
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)
Associação Brasileira de Estudantes de Engenharia Florestal (Abeef)
Campanha Nacional Por Uma Reforma Política Pela Constituinte
Central de Movimentos Populares (CMP)
Coletivo Nacional de Juventude Negra (Enegrecer)
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq)
Entidade Nacional de Estudantes de Biologia (ENEBio)
Federação das Associações de Moradores e Movimentos Populares do Espírito Santo (Famopes)
Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (Feab)
Fora do Eixo
Fórum Ecumênico ACT Brasil
Intervozes
Levante Popular da Juventude
Mídia Ninja
Movimento de Mulheres Camponesas (MMC)
Movimento dos trabalhadores e trabalhadoras do Campo (MTC)
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
Movimento dos Pescadores e Pescadoras (MPP)
Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD)
Movimento Nacional Pela Soberania Popular Frente à Mineração (MAM)
Nação Hip Hop Brasil
Pastoral da Juventude Rural (PJR)
Rede Ecumênica da Juventude (Reju)
Fonte: Rede Brasil Atual
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