A recente tragédia climática no Rio Grande do Sul trouxe à tona uma complexa rede de interesses corporativos na reconstrução do estado

Por Ananda Ridart

O fundo filantrópico emergencial RegeneraRS, que conta com a participação da Vale, busca arrecadar R$100 milhões para financiar projetos de educação, habitação, soluções urbanas e apoio a negócios. No entanto, a escolha de uma empresa envolvida em desastres anteriores para gerenciar esses projetos levanta sérias questões sobre os lucros obtidos em meio à destruição.

Iara, direção nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), expressa profunda preocupação com a situação. “Estamos vendo o capital se beneficiar da destruição que ele mesmo causa. Enquanto comunidades sofrem, essas empresas lucram, perpetuando um ciclo de exploração,” afirma. Ela destaca que, embora a solidariedade popular seja essencial, o estado está despreparado para enfrentar crises climáticas, reflexo de anos de políticas que priorizam o lucro sobre o bem-estar social e ambiental.

A Vale, que participa do fundo RegeneraRS com uma contribuição inicial de R$15 milhões, tem um histórico marcado por tragédias ambientais, como os desastres de Mariana e Brumadinho. “A reconstrução deveria focar em medidas sustentáveis e no fortalecimento das comunidades, mas, em vez disso, vemos a continuidade de um ciclo prejudicial,” critica Iara. Ela ressalta que as ações da empresa parecem mais uma tentativa de limpar sua imagem do que um verdadeiro compromisso com o desenvolvimento sustentável.

A situação nas áreas de mineração do estado é igualmente preocupante. “As mineradoras continuam operando normalmente, mesmo em meio a desastres. Isso mostra como o capital prevalece, sem considerar os impactos sociais e ambientais,” alerta Iara. Ela menciona que, mesmo com os danos causados pelas enchentes, as atividades de mineração não foram interrompidas, exacerbando os problemas enfrentados pelas comunidades locais.

Além disso, a resposta governamental, embora significativa, ainda enfrenta muitos desafios. O governo federal anunciou uma série de medidas financeiras no valor de R$15 bilhões para ajudar empresas do Rio Grande do Sul, com linhas de crédito específicas para diferentes necessidades, incluindo a compra de máquinas, obras de construção civil e capital de giro emergencial. No entanto, a burocracia e a demora na liberação desses recursos têm dificultado a recuperação das comunidades afetadas.

O futuro do Rio Grande do Sul depende de um modelo de reconstrução que priorize o desenvolvimento sustentável e a resiliência das comunidades. “Precisamos de ações concretas para mitigar os impactos futuros, e isso só acontecerá com pressão popular e uma mudança real nas políticas públicas,” conclui Iara. Ela enfatiza que a verdadeira recuperação só será possível com a participação ativa da sociedade civil e uma abordagem que coloque as necessidades das pessoas e do meio ambiente à frente dos interesses corporativos.

Enquanto isso, iniciativas como o RegeneraRS precisam ser avaliadas criticamente para garantir que os recursos sejam utilizados de maneira transparente e eficaz. A governança do fundo, composta por diversos conselhos e grupos técnicos, deve ser rigorosa em suas avaliações para que os projetos apoiados realmente contribuam para uma reconstrução inclusiva e sustentável do estado.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração